Em parte essa tristeza era pelo simples fato de eu ter imaginado uma vida que não estava acontecendo. Eu queria ter realizado coisas que não saíram como o planejado. Eu havia estipulado uma meta de cumprir meus sonhos até no máximo os dezessete anos, e me ver completando dezenove anos sem conseguir realizar nada foi a coisa mais difícil que tive de superar. E ainda por cima eu comecei a perceber as escolhas erradas que eu havia feito e me senti muito perdida.
Além de estar triste comigo mesma e completamente desolada ninguém se lembrou de comemorar meu aniversário dia 14. No início não foi um choque, mas conforme foi passando os dias eu comecei a pensar sobre isso. Eu nunca havia passado meu aniversário em branco (nem mesmo quando fiz quinze anos e não quis festa, porque eu estava voltando a ter uma crise depressiva horrível). Minha mãe chegou a me perguntar o que eu queria fazer e todas as alternativas que eu dei de comemoração foram deixadas de lado, em princípio porque estávamos sem dinheiro, mas quando já estávamos em uma situação confortável ninguém animou a sair comigo, nem mesmo quando sugeri que fóssemos ao cinema assistir "A Garota Dinamarquesa" que eu tanto queria assistir desde que havia visto o trailer no ano anterior, e eu esperei até a última semana do filme no cinema pra ver se eles mudariam de ideia, mas realmente ninguém quis ir.
Azul sempre foi a minha cor preferida e também significa o estado de tirsteza, que ironicamente se encaixa perfeitamente no meu estado de espírito. Eu sabia que precisava me expressar de alguma forma e a primeira coisa que fiz foi pintar as pontas do meu cabelo de azul. Isso foi um grande ato de liberdade, porque eu me senti pela primeira vez fazendo algo que eu relmente queria na vida. Fui contra tudo, e nesse momento comecei a enfrentar melhor a vida, as pessoas e acima de tudo a mim mesma e os meus medos.
Mas infelizmente eu conheci um lado diferente na minha família (por parte de pai), que não pareceu estar muito feliz com o meu ato repentino de pintar o cabelo de azul. Eles são muito tradicionais e mesmo sabendo o quanto eu sou meio louca, não aceitaram muito. Sinceramente eu jamais teria percebido a rejeição se eu não prestasse bastante atenção nos detalhes.
Tudo começou bem no dia do meu aniversário que caiu em um domingo, que geralmente é quando todos da família se encontram na igreja, e quando uma de minhas tias me viu, não dirigiu a palavra a mim hora nenhuma e nem sequer me deixou pegar minha priminha no colo e o tempo todo ela olhava para o meu cabelo e fazia umas caras estranhas. A segunda vez foi depois do meu aniversário quando eu já havia pintado todo o cabelo de azul e minha prima começou a precisar da minha ajuda e começou a andar constantemente comigo. Coincidentemente nessa época minha prima havia acabado de brigar com minha tia e por causa do meu bendito cabelo azul (que para eles significavam rebeldia), essa tia também começou a ficar estranha comigo (aparentemente por achar que eu havia influenciado minha prima a brigar com ela, mas eu nem sabia da briga e nem o motivo delas terem brigado). É fato que eu sempre soube que a família do meu pai acha a minha irmã mais responsável por ela ter uma aparência mais séria, mas eu não sabia que uma cor de cabelo faria um estrago tão grande ao ponto de até hoje (com meu cabelo normal), eu ainda receber certas rejeições por parte deles. Às vezes acho até engraçado que isso tudo não tenha me afetado tanto, mas a questão é que se minha mãe estava confortável comigo do jeito que eu estava o resto era resto, e permanece assim até hoje, porque só a opinião dela que importa pra mim.
Depois do cabelo, o segundo ato de independência foi tomar coragem pra ir assistir o filme que eu queria sozinha. Eu já havia ido no cinema sozinha outras vezes, mas especialmente naquela época eu estava muito triste por ninguém querer ir comigo. Então eu consegui arrastar meu amigo comigo pra ir assitir "A Garota Dinamarquesa", na última semana em que o filme estaria no cinema, mas nós chegamos atrasados e resolvemos não assistir o filme. Isso foi um dos grandes milagres de 2016 já que meu amigo nunca sai de casa e especialmente nesse dia ele estava de folga no trabalho, e por mais que não conseguimos ver o filme nós passamos um tempo juntos depois de muitos anos sem nos ver.
Mas eu não me dei por vencida e no dia seguinte eu fui sozinha assistir o filme. Era de fato o último dia do filme nos cinema e pro meu azar, agora ele só estava sendo exibido num shopping bem longe da minha casa, mas eu fui assim mesmo e quase "chorei" tamanha a emoção de estar fazendo mais uma coisa por mim mesma naquele instante. E também porque o filme era realmente maravilhoso e o Eddie Redmayne foi perfeito no papel de Lili Elbe, e o filme parecia ter sido roteirizado por mim depois de eu ter passado anos tendo um amor platônico com a modelo Andreja Pejic (antes mesmo dela trocar de gênero).
Com os dezenove anos eu não havia realizado meus sonhos antigos, mas eu me tornei corajosa e enfrentei meus medos, descobri qual era o meu sonho de verdade e busquei consertar o que eu estava fazendo de errado. Logo descobri que foi a melhor idade que tive até agora, porque eu respirei fundo e percebi que era hora de amadurecer e tomar novos rumos. Agora sei o quanto foi importante tirar um ano da minha vida pra entender as coisas, e pela primeira vez depois de crises depressivas e ansiedade me vi completando mais um ano de vida essa semana com a maior tranquilidade do mundo.
Não ter ficado louca por estar ficando mais velha foi algo inédito e eu estou mais do que pronta para começar a viver meus vinte anos!
Esse é mais um dos textos de desabafo que não tive coragem de postar na época, mas deixei salvo nos rascunhos. Foi escrito no dia 17.02.2017
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